terça-feira, 8 de setembro de 2015

A ORIGEM DA TRAIÇÃO

Nesses cinco anos trabalhando com aconselhamento, já recebi centenas de pedidos de socorro e, dentre todos os assuntos e desabafos, sem sombra de dúvidas o tema mais recorrente é a traição: “Eu traí, fui traído ou estou prestes a trair”. Acho que recebo pelo menos dois ou três desses por semana. Antes de continuar, gostaria apenas de esclarecer que não sou pastora ou psicóloga. Apenas amo escutar e entender a mente do ser humano, por isso me joguei na área do aconselhamento e decidi também estudar a psicanálise (que é diferente da psicologia). Leio, estudo muito e amo escrever, mas confesso que apesar de ter ciência da importância da teoria, aprendi muito mais escutando e me relacionando com pessoas. Essa é a melhor das escolas!

Decidi escrever esse artigo com a intenção de auxiliar as dezenas de vidas que me procuraram em busca de ajuda. Meu objetivo não é trazer respostas prontas, apenas apontar um caminho. Entendo que cada um deve olhar para dentro de si e encontrar o seu. E para te ajudar nessa tarefa, coloco hoje “sobre a mesa” um bocado de informações. Sugiro que leia atentamente, absorva com carinho e busque em Deus a melhor saída para a sua difícil situação.
Como disse anteriormente, percebo que a maior dificuldade na relação a dois é manter a fidelidade. Os homens produzem espermas diariamente, enquanto que as mulheres, produzem óvulos mensalmente. Pensando nessa proporção e também pela lógica, deveríamos imaginar que homens tem um desejo maior do que as mulheres, portanto, traem mais. Mas observando os depoimentos que recebi nos últimos cinco anos, não tenho como apoiar essa teoria. Se fizesse um balanço de traições, penso que os pesos estariam praticamente igualados. E não, não sei explicar o porquê, rs.
A maioria das pessoas que me procuram são cristãs, talvez 97% delas, ou seja, é certo que essa realidade também está presente dentro das igrejas, talvez até de forma mais doentia, pois a “proibição” que encontram em sua fé faz da culpa um fardo gigantesco, que acaba estourando em forma de doenças psicossomáticas, ou seja, as dores da alma dando sinais no corpo.
Cheguei a conclusão de que praticamente todo o ser humano sente uma hora ou outra o desejo de trair, ou seja, de possuir outro parceiro. Para a ciência isso é visto como algo muito comum e, inclusive, esperado. A psicanálise, através da teoria de Freud, explica esse desejo da seguinte forma:
A mente humana está dividida em três partes: ID, ego e superego.
teoria-freudiana
  • O ID é irracional e impulsivo, busca o prazer sem se preocupar com a realidade e a moral;
  • O Superego anseia pela perfeição moral e tenta reprimir de forma severa todas as ações que vão de encontro a imoralidade;
  • O Ego procura satisfazer os impulsos do ID e também cumprir as exigências morais do Superego.
Observando dessa forma, podemos notar então que num cenário de adultério o que acontece em nossa mente é que o ID, o “bebê chorão”, vai espernear, gritar e bater o pé até conseguir o que deseja, nesse caso, o(a) possível amante. Já o superego colocará em cheque todos os riscos: o sofrimento, a destruição da família, as consequências do divórcio, as qualidades do cônjuge e etc. Enquanto que o Ego, que é o seu “eu”, fará o papel de ‘meio de campo’, tentando administrar e satisfazer os dois lados.
A fé cristã provavelmente esboçaria o desenho acima da seguinte forma:
id-ego-superego
Mas é certo que, sendo cristãos ou não, se fôssemos satisfazer todas as vontades e impulsos do ID, a humanidade se extinguiria. O superego desempenha um papel importantíssimo, que a minha fé explica como sendo o próprio Espírito Santo de Deus nos orientando e dizendo o melhor caminho a seguir. Aos meus olhos, essa é a explicação para a sobrevivência da raça humana. O ID (ou o mal) é um carrinho sem freios numa grande ladeira. Deus é o que segura esse carrinho. Sem ele nos devoraríamos!
Todo, absolutamente todo o ser humano passará pela experiência da tentação, ou seja, de ouvir o seu “bebê chorão” gritando e esperneando por aquilo que causa destruição de vidas e relacionamentos. Veja que interessante Paulo (que nasceu bem antes de Freud) descrevendo a briga entre o ID e o Superego:
“Porque tenho o desejo de fazer o que é bom, mas não consigo realizá-lo. Pois o que faço não é o bem que desejo, mas o mal que não quero fazer, esse eu continuo fazendo.” Romanos 7:18,19
Perceba que ele não diz “o mal que não quero eu quaaaase faço”, pelo contrário, Paulo afirma categoricamente que o mal que não quer ele continua fazendo, ou seja, seu ID chora e ele insiste em atender seus desejos, mesmo diante dos alertas do superego.
Pois bem, diante desse fato, podemos concluir que aqueles que traíram são os que cederam as vontades do ID; os que estão prestes a trair, decidiram não dar ouvidos ao superego e, os que foram traídos, agora conseguem entender um pouquinho melhor o que aconteceu com a mente de seu cônjuge. Mas por que alguns conseguem resistir mais aos “gritos” do ID do que outros? Penso que alguns resistam fisicamente, mas a grande maioria cede às suas vontades em pensamentos. O que quero dizer? Talvez você não traia seu cônjuge fisicamente, mas é bem provável que já tenha estado com alguns (ou muitos) amantes imaginários, o que, aos meus olhos, representa o mesmo estrago moral. Adultério do mesmo jeito: “Mas eu lhes digo: qualquer que olhar para uma mulher para desejá-la, já cometeu adultério com ela no seu coração.” Mt 5:28.  A diferença aqui é que, como o seu cônjuge não lê a sua mente, não sofre.
Por isso insisto em dizer que numa relação a dois é saudável a transparência e falta de hipocrisia. Mentiras e máscaras infantilizam pessoas e adoecem relacionamentos. Se fôssemos trazer a fala de Paulo para o nosso contexto, teríamos:
“Querido(a), tenho o desejo de nunca te trair, nem em pensamento! Sei o quanto isso é ruim, mas não consigo… O que faço não é o bem que desejo, mas o mal que não quero fazer, esse continuo fazendo. Foge ao meu controle…”
Um casal muitíssimo sincero, conseguiria olhar um nos olhos do outro e dizer a frase acima sem julgamentos, apenas com coração amoroso e compreensivo: “Somos dois seres humanos falhos, tentando fazer o que é certo. Vamos continuar caminhando, tentando e nos ajudando”. Parece surreal? Sim, parece. Realmente não conheço um casal sequer que aja dessa forma, mas sigo acreditando que a transparência será sempre o melhor caminho.
Trair é errado? Prefiro acreditar que não existe certo ou errado, mas sim escolhas e suas consequências. Somos livres para fazer escolhas, mas é importante lembrar que sempre seremos escravos das consequências e não é segredo para ninguém que as consequências de um adultério são sempre devastadoras.
Como disse anteriormente, não quero com esse artigo trazer respostas. Creio que o caminho para o amadurecimento passa pelo autoconhecimento e, isso é algo muito particular, por isso aconselho que pegue todas as informações colocadas acima e olhe para dentro de si. Na caminhada da vida passe a observar seus impulsos e desejos, note a briga constante entre o seu ID e o superego e, assim como Paulo, grite: “Miserável homem que sou! Quem me libertará do corpo sujeito a esta morte?”
Para nós, cristãos, fica o consolo da resposta: “Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor!”
Autora: Daniela Marques